A depressão no meio evangélico



Quem conhece meu trabalho sabe que uma de minhas linhas de pesquisa e atuação é na psicologia da religião, uma parte da psicologia que tem como objetivo compreender como acontece, se constrói e se processa o comportamento religioso das pessoas, e um dos pontos interessantes que eu tenho visto é o de alguns grupos religiosos que são acometidos por dificuldades psicológicas e que muitas vezes não encontram informações suficientemente claras.

Por isso eu gostaria de falar sobre um processo que tenho visto com freqüência, a depressão se alastrando no meio evangélico, e eu gostaria de trabalhar esta questão, já que esta população representa quase 30% dos brasileiros.

Quando falamos de evangélicos, é preciso fazer algumas distinções: são um grupo bastante heterogêneo, o que quer dizer que existem vários subgrupos que diferem de comportamento de forma visível – ou seja, nenhum evangélico é igual ao outro. Batistas são diferentes de presbiterianos, que são diferentes de assembleianos, que diferem dos freqüentadores da Igreja Universal, etc. Mas porque esta informação é importante? Pelo fato de que cada subgrupo possui um diferente sistema de símbolos, e isso influencia diretamente no emocional das pessoas a estes pertencentes.

Então vamos lá... a depressão é uma doença. Encontra-se na intersecção entre o biológico, o psicológico e o social, e é muito diferente da “tristeza” comum e simples que pode acometer qualquer pessoa. Atualmente não existem exames laboratoriais que sejam capazes de apontar o diagnóstico de depressão, mas este é feito por meio do que chamamos de exame psíquico que é realizado por um profissional habilitado em saúde mental (médico psiquiatra ou psicólogo), que também indicará uma prescrição terapêutica.

Podem existir diferentes sintomas no caso de depressão... o mais conhecido, e comum, é um sentimento de desalento, tristeza persistente, uma falta de vontade incapacitante para as atividades comuns do dia a dia. Cabe deixar claro que a depressão não escolhe um tipo específico de pessoa, e nem que ela é produto de algum tipo de fraqueza psicológica: ela acontece por um conjunto de fatores que, associados, geram um estado de dificuldade psicológica.

Mas porque eu quero falar deste caso, em específico no meio evangélico? Porque eu tenho percebido que ela tem sido sentida de forma muito mais intensa neste meio e, via de regras, poucas pessoas sabem que devem ou em que momento procurar ajuda. Isso acontece porque existem elementos simbólicos no meio evangélico que minimizam ou mascaram o diagnóstico da depressão.

“Crente pode ter depressão?”

Essa pergunta é frequente, e tem gente que acha que não... ter fé em um poder sobrenatural superior não te faz ter super poderes, e a filosofia do cristianismo não garante que cristãos serão isentos de sofrer dificuldades na terra:

“Elias era homem sujeito às mesmas paixões que nós” Thiago 5:17a

Jesus, ao orar pelo seus discípulos:

“Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal” João 17:15

Ou seja, o cinto também pode apertar sobre o lombo do crente, a dor pode chegar e as lágrimas podem cair... e, para além das convencionais tristezas da vida, pode também adoecer. A própria Bíblia, livro dos cristãos, dá relato de que Jesus chorou amargamente com “tristeza de morte” antes de ser crucificado (Mt 26:36-38).

Ou seja, a depressão pode acontecer com qualquer um:

“Tudo sucede igualmente a todos; o mesmo sucede ao justo e ao ímpio, ao bom e ao puro, como ao impuro; assim ao que sacrifica como ao que não sacrifica; assim ao bom como ao pecador; ao que jura como ao que teme o juramento” Eclesiastes 9:2

Mas porque muitos evangélicos não procuram ajuda?

Se uma pessoa está sofrendo, não consegue enxergar solução para seu problema, está tendo suas funções diárias prejudicadas, porque não procura ajuda? Vou listar algumas coisas que eu tenho percebido como motivos.

O primeiro grande motivo é o medo: alguns evangélicos chegam no consultório com medo de, durante a sessão de psicoterapia, serem convencidos de que Deus não existe, ou de que o psicólogo vá fazer alguma coisa para “influenciar” seu pensamento, ou de que este não irá compreendê-lo... este é um dos motivos mais comuns pelo qual ligam nas clínicas pedindo por um “psicólogo evangélico”. Temos que notar que, independentemente da religião do psicólogo, seja evangélico, espírita, católico, budista ou ateu, ele deverá atuar pautado na técnica psicológica e não em sua crença religiosa. Um psicólogo deve buscar ter condições de compreender a dificuldade de uma pessoa independentemente da religião à qual ela professa.

Vergonha do preconceito da comunidade. Isso acontece geralmente entre líderes religiosos, pastores, líderes de grupos, porque eles têm medo do que as pessoas vão pensar pelo fato de eles terem depressão. Alguns grupos religiosos pensam que algumas doenças são fruto de falta de fé, ou que é castigo divino, por isso, líderes estão muito mais sujeitos às pressões sociais dos grupos aos quais eles mesmos coordenam, e tentam, por isso, manter determinadas aparências para não terem sua fé questionada.

Algumas pessoas também não procuram ajuda porque acham que não precisam e que são autossuficientes, e que vão dar contas sozinhas... isso pode ser considerado orgulho. Sim, esta é uma característica relativamente comum em alguns grupos religiosos, onde existem algumas pessoas que não podem “dar o braço a torcer” e confessar que possuem fragilidades.

Desinformação... sim, o básico de sempre! Não saber o que é depressão, como ela se manifesta, ou o que fazer quando ela aparece. A falta de informação sobre ela, pensar que ela é uma simples tristeza que vai passar, afeta a forma como as pessoas agem e reagem diante desta dificuldade.

Incompreensão daquele versículo que diz que “somos mais que vencedores” (Romanos 8:37) que se refere à vitória da vida sobre a morte espiritual... Alguns cristãos muitas vezes extrapolam na interpretação deste versículo, levando ele para o lado mais material da vida, achando que este versículo é uma garantia de sucesso para tudo o que eles vão fazer na vida. Este é um tipo de pensamento meio “mágico”, que sabota a capacidade de alguns cristãos de lidarem com as frustrações comuns da vida. Logo, é preciso tomar consciência de outras possibilidades de interpretação das situações de sua própria vida.

E por último, uma coisa clássica no meio de alguns grupos religiosos: a dificuldade de separar o espiritual, do físico e do psicológico. Tem gente que ora Deus dar dinheiro para elas, e esquecem de trabalhar para ganhar dinheiro; tem gente que deixa de tomar medicamentos, pensando estar seguindo as orientações divinas e dando um passe de fé, e acabam piorando doenças físicas; e tem gente que pensa que dificuldades psicológicos se resolvem na base de rituais... é preciso separar cada coisa: o que é espiritual, que seja tratado de forma espiritual; o que físico, de sua forma; e o psicológico de sua forma também. Note que eu não estou dizendo que o Deus que você acredita não tem o poder para resolver qualquer coisa, só estou dizendo que você precisa fazer a sua parte primeiro para depois ele fazer a Dele.

Se você é um cristão e está com dificuldades psicológicas, não transfira para Deus a sua responsabilidade, aquela que vem com seu livre arbítrio para decidir sobre a sua vida. Se você precisa de ajuda profissional, porque não a procura? Caso você se identifica com alguma destas dificuldades acima listas, reflita se não está na hora de promover uma mudança na vida psicológica para ter aquela sensação de bem estar que você tanto procura?

Se você entendeu esta mensagem, e se convenceu que precisa de ajuda... basta entrar em contato com um profissional de sua confiança... agora, se você quiser conhecer meu trabalho e fazer uma avaliação de seu caso, entre em contato pelo whatsapp (62) 99446-3122.

Desejo a você toda saúde e felicidade possíveis.

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Sobre o autor:

Murillo Rodrigues dos Santos, psicólogo (CRP 09/9447), mestre em Psicologia, psicoterapeuta e consultor empresarial. Pesquisador em psicologia da religião. Diretor do Instituto Psicologia Goiânia.

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